Dicas para embarcar sem receio em uma viagem de ecoturismo

POR MITSI GOULIAS
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Qual é a diferença entre ecoturismo, turismo de aventura e turismo rural?
Apesar de estarem ligadas a atividades na natureza, cada uma dessas formas de turismo tem suas características próprias. Na definição da EcoBrasil (
www.ecobrasil.org.br), entidade ligada à Ecotourism Society - a associação mundial do ecoturismo -, a utilização de maneira sustentável do patrimônio natural e cultural, com benefícios econômicos para o meio ambiente e para a comunidade local fazem parte da essência do ecoturismo. Já o turismo de aventura envolve a prática de esportes ao ar livre, como mergulho, montanhismo, rafting, mountain biking, com equipamentos específicos. No turismo rural, fazendas são adaptadas para receber hóspedes, que participam de atividades típicas (ordenha de vaca) e de lazer (pesca em represa, cavalgada). O termo ecoturismo, porém, acaba sendo usado para designar os três casos. A Embratur calcula que meio milhão de brasileiros é adepto das viagens ecológicas. É comum encontrar famílias fazendo programas de ecoturismo em Bonito e no Pantanal.

Que roupa usar para andar nas trilhas?
Da cabeça aos pés, você deve estar vestido de maneira adequada para um passeio que pode levar o dia inteiro. Um boné protege o rosto do sol. Camisetas de algodão ou blusas de tecido que absorve o suor, como o supplex, são uma boa escolha. Nas trilhas abertas, prefira as bermudas, mas se o trekking for em mata fechada, opte por calças para evitar arranhões. Ao andar nas montanhas, vista-se em camadas, com um casaco impermeável por cima de tudo. Vai fazer rafting ou mergulhar em cachoeiras? Então inclua uma muda de roupa extra, embalada em saco plástico e guardada na mochila. Se pretende caminhar bastante, escolha botas confortáveis, isto é, amaciadas e folgadas. Use duas meias, uma fina e outra mais espessa por cima, para evitar bolhas. Muitas agências de ecoturismo enviam aos clientes uma lista das roupas apropriadas para cada tipo de roteiro.

Como escolher uma agência de ecoturismo?
De acordo com o Instituto de Ecoturismo do Brasil, existem 250 operadoras e agências especializadas, setenta das quais na cidade de São Paulo. Porém, a maioria não tem registro na Embratur (o órgão que regulamenta a atividade das empresas de turismo) nem faz parte da Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abav). Portanto, o primeiro passo é fazer uma pesquisa nos sites
www.embratur.gov.br e www.abav.com.br. Selecionadas as opções, verifique o roteiro da agência em detalhes e confira se ele se encaixa no tipo de passeio que você procura. Outra providência é saber se os guias são mesmo especializados, com cursos na área. Se a viagem envolver algum esporte de aventura, certifique-se do estado dos equipamentos de segurança e de qual é a infra-estrutura para lidar com acidentes. Tome referências com outros clientes.

Preciso freqüentar um curso ou basta um treinamento para fazer canyoning e rapel?
Depende do grau de dificuldade do programa. Grande parte dos passeios oferecidos pelas agências de ecoturismo pode ser feita por iniciantes e, nesse caso, as instruções são dadas pouco antes da descida. Um rapel de 10 a 20 metros de altura, por exemplo, como o da Cascata do Marmeleiro, em Canela (RS), não exige experiência prévia. Já um canyoning na Cachoeira do Saltão, em Brotas (SP), com queda de 70 metros e paredão de rocha sem vegetação, é indicado para esportistas com prática. A Associação Brasileira de Canionismo (
www.abcanion.com.br) indica boas escolas em diversos Estados do país. Mas, lembre-se: mesmo com um curso, nunca se deve descuidar dos equipamentos e procedimentos de segurança.

Não estou em grande forma física. Posso participar de uma caminhada ainda assim?
A caminhada (ou trekking) é uma atividade que pode ser praticada por qualquer pessoa, de crianças a idosos. Isso porque há variações no grau de dificuldade e no tempo de duração - escolha o tipo mais adequado a seu preparo físico. O trekking leve, por exemplo, é feito em trilhas já demarcadas e em trechos curtos. Boas opções para os iniciantes estão no Parque Nacional da Serra do Cipó, em Minas Gerais. O trekking médio pode durar um dia inteiro, com paradas para refeições e banhos de cachoeira. No trekking pesado andam-se horas ou até dias, e o caminho inclui trilhas fechadas e obstáculos naturais, nos quais muitas vezes é preciso recorrer a técnicas de escalada. É o caso da travessia Petrópolis-Teresópolis, no Rio de Janeiro. Mas antes de pôr o tênis na trilha, prepare o corpo: exercícios de alongamento são necessários mesmo para os mais experientes. Todos os músculos devem ser aquecidos, principalmente dos pés e das pernas. Durante a caminhada, mantenha um ritmo regular. Não tenha pressa e prefira passadas longas às curtas, que consomem mais energia.

Que cuidados tenho de tomar para evitar acidentes em cachoeiras?
Até as menores quedas d'água precisam ser encaradas com atenção. Nunca mergulhe de cabeça sem verificar qual é a exata profundidade do poço. Cuidado com as pedras escorregadias - as de cor preta são as piores. Molhadas, viram o atalho mais rápido para um tombo. Se não quiser andar descalço, prefira as botas com velcro em vez do tênis. Ao sentir que lhe falta apoio, não hesite em andar de quatro. Assim, o estrago será menor em caso de queda. Para atravessar rios e corredeiras, use uma corda. E desista de freqüentar cachoeiras em dias de chuva.

A que tipo de riscos eu estou sujeito ao fazer um rafting?
A probabilidade de cair na água é grande - aliás, muitos turistas até torcem para que isso aconteça. Uma corda levada no bote ou o cabo do remo permitem o resgate, e nos trechos mais radicais existe um caiaque de apoio. As corredeiras dos rios são classificadas de acordo com o grau de dificuldade. Há seis níveis, que ainda podem ganhar o sinal de + ou - para tornar a denominação mais precisa. O nível I indica trechos de águas calmas e o VI aplica-se às corredeiras não navegáveis. Mesmo quem não tem prática pode fazer um rafting: os novatos recebem as instruções básicas antes da descida do rio e sempre vai um guia no bote com o grupo. Saber nadar é obrigatório, apesar de todos usarem salva-vidas. Contusões e dentes quebrados causados por acidentes com o remo são riscos reais, por isso deve-se usar capacete e prestar atenção às orientações. Escolha uma boa operadora e faça um roteiro compatível com sua experiência.

O que devo comer antes e durante uma caminhada?
Um café da manhã reforçado garante energia para o dia todo. Risque do seu cardápio alimentos gordurosos, condimentados, enlatados, doces e refrigerantes. Para um trekking leve, prefira frutas naturais (mexerica, banana, maçã) ou cristalizadas (ameixa, figo). Os sanduíches devem ser preparados no dia da viagem, sem maionese ou requeijão, que podem ser substituídos por margarina ou algum tipo de geléia. Bolachas, barra de cereais e um chocolate completam o menu. É melhor comer em intervalos menores e em pouca quantidade do que se empanturrar no almoço. Ao fim da caminhada, abasteça o corpo com uma refeição quente e completa. Mantenha o organismo hidratado - beba um copo de água a cada meia hora, num total de pelo menos 2 litros por dia. Não vale completar a medida com álcool.

E se eu encontrar um bicho perigoso no meio da trilha?
Um dos últimos animais que os ecoturistas querem ver pelo caminho são cobras - e as chances de vê-las são mesmo poucas. Esses répteis evitam cruzar trilhas movimentadas, mas se acontecer, o melhor é fingir-se de samambaia e deixá-los seguir em frente. Ande sempre calçado e observe bem onde pisa e põe a mão. Aranhas gostam de se esconder dentro dos tênis. Sacuda o calçado antes de colocá-lo nos pés. Guias sabem como reagir diante da presença da fauna selvagem. Por isso, é bom estar acompanhado de um profissional experiente. As chances de encontrar jaguatiricas e onças são mínimas. Em todo caso, saiba que costumam usar cavernas como abrigo. Restos de carcaças ou pegadas na entrada das cavernas são sinais de ocupação. Mesmo que você encontre animais aparentemente mansos na trilha, mantenha distância. Não ofereça comida e muito menos tente acariciá-los. Os macacos, por exemplo, são imprevisíveis.

Vou ser devorado por insetos durante as caminhadas?
Pernilongos, abelhas, formigas, borrachudos, vespas e marimbondos podem, com uma simples picada, estragar as férias - quem tem pele sensível ou é alérgico sabe disso. Repelentes, mangas longas e calças compridas mantêm os temíveis ferrões afastados. Algumas pessoas conseguem bons resultados ao tomar vitaminas do complexo B todos os dias, uma semana antes e durante a viagem. O cheiro exalado pelo corpo espantaria os insetos, mas há controvérsias sobre a eficácia do método. Marimbondos tornam-se especialmente agressivos nos dias mais quentes. Por isso, desvie assim que vir uma casa de marimbondo. Elas são construídas em árvores e lembram um formigueiro. Se ainda assim você for atacado por algum inseto, lave bem o local com sabão. Tire o ferrão com uma pinça ou agulha e besunte-se de pomada própria para picadas. Na falta do medicamento, use álcool ou aguardente para massagear o local atingido.

Posso levar meu filho para me acompanhar numa viagem ecológica?
O contato com a natureza é sempre saudável. Muitas crianças têm até mais disposição e coragem do que adultos para fazer as atividades típicas de um roteiro de ecoturismo. No entanto, é preciso analisar o perfil do pequeno viajante e o grau de exigência do passeio escolhido. Seu filho vai agüentar o ritmo da caminhada ou pedirá colo depois de dez minutos? Leve em conta, também, a infra-estrutura do local visitado - há serviço médico por perto? Lembre-se, ainda, de que a mochila tem de estar equipada com o que uma criança pode necessitar. Apesar de haver casos de guris de 7 anos que já fazem rapel, os especialistas recomendam 16 anos como a idade mínima para a prática desse esporte, bem como de canyoning e caving. A partir dos 12 anos, eles podem fazer bóia-cross, rafting e mergulho.

Tenho de fazer todos os passeios previstos no pacote da agência?
Na maioria dos pacotes de ecoturismo, sempre que há uma atividade muito radical no programa, ela é opcional - e existe um "plano B", sem custo adicional, para ocupar aqueles viajantes que têm receio de fazer rafting porque não sabem nadar ou sentem pavor de altura para se lançar em um rapel de 30 metros. Quem não quiser participar de um passeio incluído no roteiro deve tentar negociar um desconto ou substituição por outra atividade. Mas isso vai depender de a agência ter acordo com fornecedores locais para apresentar uma alternativa ao cliente, o que pode acarretar o pagamento da diferença.

Quais são as regras de conduta numa viagem de ecoturismo?
"Não tire nada além de fotos, não deixe nada além de pegadas, não mate nada além do tempo." Guias e praticantes do ecoturismo repetem essa frase como um mantra da natureza. E com razão. Ninguém gosta de encontrar embalagem de comida jogada na trilha ou latinhas de refrigerante boiando num rio. Por isso, todo e qualquer lixo deve ser embrulhado e trazido de volta para ser despejado em local adequado. Nada de queimar ou enterrar a sujeira produzida. Nas caminhadas, siga pelas trilhas principais ou pelas já abertas. Os atalhos favorecem a erosão e a destruição de raízes e plantas. Evite fazer fogueiras, mas, se não tiver alternativa, use os galhos já caídos e ao fim apague bem as cinzas. Cuidado com as bitucas de cigarro, que podem provocar um estrago em regiões muito secas. Ao visitar cavernas, não toque - e muito menos leve de suvenir - em estalactites ou estalagmites. Essas belas esculturas naturais precisaram de milhares de anos para se formar. Deixe o cãozinho ou o gato em casa e não grite na mata, para não assustar a fauna.

Estou perdido na mata. O que fazer?
Se você estava com um grupo e se afastou, procure não se movimentar muito, para facilitar o resgate. Os locais por onde você passar devem ser sinalizados, usando galhos e gravetos para criar setas indicando a direção seguida. Com um apito, emita sons repetidos. Faça uma fogueira e alimente-a com folhas verdes, que produzem mais fumaça. Acha que ninguém vai procurá-lo tão cedo? Então siga o curso de um rio, onde pode encontrar uma cabana ou um povoado. Mas para evitar uma situação tão extrema, tome alguns cuidados: nunca se aventure sozinho e deixe os parentes avisados sobre seu roteiro. O planejamento da viagem é essencial. Pesquise na internet, converse com quem já fez o passeio antes e consiga um mapa detalhado do local. Calcule bem o tempo, para não ser pego de surpresa pela noite no meio da mata. Numa caminhada em grupo por uma trilha fechada, siga em fila indiana, com o mais experiente na frente e o segundo mais preparado por último. Ninguém deve se distanciar sem avisar ao guia ou ao líder.

O que preciso saber para explorar cavernas?
Antes de se aprofundar em grutas e abismos, é indispensável estar bem preparado para a empreitada. A prática do caving - como também é chamada a exploração de cavernas - exige boa forma física, para passar por fendas estreitas e nadar em lagos submersos, e experiência em rapel para atravessar galerias. Os apetrechos básicos são capacete, três fontes de luz (lanternas de cabeça e de mão), calçado com sola anti-derrapante e macacão para proteger o corpo. Nunca entre numa caverna sozinho e avise parentes ou amigos sobre o local exato da exploração. A companhia de um guia é imprescindível para driblar situações de risco e impedir que os turistas se percam entre salões e corredores. Verifique as condições climáticas para não ser surpreendido pelo repentino aumento do nível dos rios subterrâneos causado pelas chuvas. Se você nunca entrou numa caverna, comece com as abertas ao público, que têm estrutura para visitação. A região do Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (Petar), em Iporanga, no sul do Estado de São Paulo, concentra cavernas de vários níveis de dificuldade. A Caverna do Diabo, por exemplo, tem até iluminação interna. Mais informações na Sociedade Brasileira de Espeleologia, www.sbe.com.br.

Que itens não posso deixar de levar na minha mochila?
Antes de fazer a mochila, avalie a real necessidade de cada coisa. Do contrário, com excesso de peso nas costas você vai ter ímpetos de atirar metade da bagagem no primeiro cânion que encontrar. Os itens indispensáveis são: lanterna, estojo de primeiros-socorros, cantil, canivete, apito para emergência, isqueiro (ou fósforos), bússola, uma muda de roupa seca, lanche, protetor solar, repelente de insetos e celular com uma bateria extra. Distribua o peso de maneira equilibrada e procure guardar tudo dentro da mochila, sem prender nada do lado de fora, para não se enroscar em galhos. As mãos devem ficar livres - para manejar a máquina fotográfica.